Prof. Dr. Luiz Arthur Feitosa dos Santos - IPv6

IPv6 (Internet Protocol version 6)

Introdução

Prof. Luiz Arthur Feitosa dos Santos

luiz.arthur.feitosa.santos@gmail.com/luizsantos@utfpr.edu.br

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Introdução ao IPv6

O IPv4, que serve como base para o funcionamento da Internet vem do final da década de 1970 início de 1980. Entretanto, com a popularização dos computadores e com o surgimento de conceitos como IoT, no qual espera-se que cada pessoa/empresa conecte inúmeras dispositivos, os ~4 bilhões endereços do IPv4 basicamente já se esgotaram.

Para resolver tal problema, surge na década de 1990 o IPv6 (Internet Protocol version 6), que dá a possibilidade de endereçar 1.500 hosts por metro quadrado do planeta terra, com os seus bits de endereço e resolve o problema da falta de endereços IPs válidos na Internet.

Então, o IPv6 é a mais recente versão do protocolo IP, sendo desenvolvido para substituir o IPv4. No entanto, mesmo com esse contexto, o IPv6 ainda hoje (2025) não substituiu completamente o IPv4, isso por vários motivos, tais como: medo do IPv6 apresentar problemas desconhecidos. Todavia o IPv6 vem ganhando forçar para essa substituição nos últimos tempos e por isso merece atenção.

Este texto pressupõe que você já saiba IPv4 em detalhes.

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Motivação para a Criação do IPv6

O esgotamento do IPv4 foi o principal motor.

  • 1993: IETF reconhece o problema e cria o grupo IPng (IP Next Generation).
  • 1998: IPv6 é oficialmente padronizado (RFC 2460).
  • 2011: IANA (Internet Assigned Numbers Authority) esgota o pool global de endereços IPv4.
  • 2012: World IPv6 Launch (Google, Facebook, Yahoo) habilitam o IPv6 permanentemente.

Então em 2012 a IETF, junto com a Internet Society, Google, Facebook, Yahoo, Akamai e outras grandes empresas realizaram um evento coordenado chamado World IPv6 Launch.

A partir do World IPv6 Launch, as empresas envolvidas habilitaram o IPv6 sem suas redes/serviços e o IPv6 passou do status de experimental para produção permanente de serviços reais. Isso por exemplo obrigou/obriga que provedores de Internet comecem a dar suporte IPv6 aos seus clientes, ou pelo menos a se planejar para isso.

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Crescimento da Adoção Global (2012-2024)

A tabela a seguir apresenta o crescimento do uso do IPv6, desde 2012 até 2024:

Ano Adoção Global Estimada Contexto/Evento
2012 ~1-2% World IPv6 Launch
2014 ~3-4% Mais provedores começam a oferecer IPv6
2018 ~15-20% Aceleração significativa
2020 ~25-30% Pandemia acelera transformação digital
2022 ~35-40% Adoção em 40% em países desenvolvidos
2024 ~40-45% Brasil ultrapassa 50% em Fev/2024!

*Fontes: Google IPv6 Statistics, ipv6.br *

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O que mantém o IPv4 vivo ainda hoje?

O IPv4 ainda é sustentado por adaptações técnicas ("gambiarras") que prolongaram sua vida útil:

  • CIDR (Classless Inter-Domain Routing)
    • Permitiu alocação flexível, eliminando as classes A, B e C.
  • DHCP (Dynamic Host Configuration Protocol)
    • Permitiu reutilização eficiente de IPs.
  • NAT (Network Address Translation)
    • Permitiu que múltiplos dispositivos compartilhassem um IP público.

Embora essas soluções tenham sido eficazes em adiar o problema, elas introduziram complexidades e limitações que o IPv6 foi projetado para eliminar isso e veremos isso posteriormente.

O NAT por exemplo, cria pontos de passagem obrigatórios e exige a alteração constante de pacotes, o que torna o processo de roteamento de pacotes mais complexo.

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Objetivos do IPv6

O IPv6 não foi criado apenas para resolver o problema de escassez de endereços, mas também para oferecer melhorias significativas:

  1. Espaço de endereçamento expandido: de , para ;
  2. Simplificação do cabeçalho IP: O que torna o processamento das informações mais rápido;
  3. Autoconfiguração (SLAAC): Possibilidade real de autoconfiguração dos dispositivos de rede, sem depender de um servidor DHCP;
  4. Segurança nativa: IPsec é parte obrigatória - vem pronto para uso, mas não quer dizer que está ativado (precisa configurar).
  5. Melhor suporte para QoS: permitindo classificação de tráfego pelo fluxo de rede que ele pertence, sem por exemplo verificar os outros cabeçalhos (ex. outras camadas);
  6. Eliminação de broadcast: na verdade ainda há algo similar ao broadcast, mas é um multicast especial que fica confinado dentro de um enlace de rede;
  7. Mobilidade - MIPv6: suporte nativo para dispositivos móveis. Isso permite que você continue com um IP, mesmo que você saia de uma rede e entre em outra (ex. saída de uma rede 5G para uma WiFi).
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Endereçamento IPv6: Estrutura

O IPv6 é estruturado da seguinte forma:

  • 128 bits de comprimento.
  • Divididos em 8 grupos (hextetos) de 16 bits cada.
  • Escritos em notação hexadecimal.
  • Separados por dois pontos (:).

Exemplo de um endereço IPv6 completo:
2001:0db8:85a3:0000:0000:8a2e:0370:7334

Exemplo do IPv6 do DNS do Google:
2001:4860:4860:0000:0000:0000:0000:8888

Exemplo do IPv6 do DNS do CloudFlare:
2606:4700:4700:0000:0000:0000:0000:1111

Os dois últimos exemplos são os antigos 8.8.8.8 e 1.1.1.1 do IPv4, que são IPs do Google e CloudFlare, respectivamente.

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Endereçamento IPv6: Regras de Simplificação

Temos duas regras para tornar os endereços mais legíveis:
1. Omissão de Zeros à Esquerda

  • Zeros à esquerda em cada grupo podem ser omitidos.
  • Original: 2001:0db8:00a3:0000:0000:08a2:0370:7334
  • Reduzido: 2001:db8:a3:0:0:8a2:370:7334

2. Compressão de Sequências de Zeros (::)

  • Uma sequência contínua de grupos de zeros pode ser substituída por ::.
  • Esta regra SÓ PODE SER USADA UMA VEZ por endereço!
  • Original: fe80:0000:0000:0000:0000:0000:0000:0001
  • Reduzido: fe80::1

Então os IPs do DNS do Google e do CloudFlare na forma contraída ficam da seguinte forma: 2001:4860:4860::8888e 2606:4700:4700::1111, respectivamente.

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Prefixo, CIDR e Estrutura Global

Assim como no IPv4, o IPv6 utiliza a notação CIDR:
2001:db8:abcd:0012::/64

  • /64 = Comprimento do Prefixo (primeiros 64 bits identificam a rede).
  • Restantes 64 bits = Interface ID (identificador do host).

Estrutura padrão de um Endereço Global (GUA):

48 bits 16 bits 64 bits
Global Prefix Subnet ID Interface ID
(Rede da Operadora) (Sub-redes locais) (Host)

Recomendação padrão: Usar prefixo /64 para todas as LANs.

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Tipos de Endereços IPv6

O IPv6 define três categorias principais:

1. Unicast

  • Identifica uma única interface de rede.
  • (Global, Local, Link-Local).

2. Multicast

  • Identifica um grupo de interfaces.
  • Pacote é entregue a todos os membros do grupo.

3. Anycast

  • Identifica um conjunto de interfaces (geralmente em roteadores).
  • Pacote é entregue à interface mais próxima (conforme roteamento).
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1. Endereços Unicast

Um pacote enviado para um endereço unicast é entregue apenas um único dispositivo de rede. A seguir são apresentados os endereços IPv6 Unicast:

1.1 Endereços Global Unicast Address (GUA)

Esses são os endereços IPs públicos, válidos na Internet e portanto são roteáveis na Internet. Ou seja, são os IPs utilizados para identificar hosts na Internet. Esses IPs são:

  • Prefixo: 2000::/3 (Binário 001..., ou seja, IPs começando com 2 ou 3).
  • Uso: Endereços roteáveis globalmente na Internet.
  • Equivalente IPv4: IP Público.

Então a faixa de endereços GUA é 2000::/3, sendo:

  • 2000::, o menor IP possível;
  • 3FFFF:FFFF:FFFF:FFFF:FFFF:FFFF:FFFF:FFFF o maior IP possível.
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1.1 Endereços Global Unicast Address (GUA)

Então IPs que iniciam com 2ou 3 são roteáveis na Internet. Desta forma na Internet com IPv6 só teremos essa faixa de IPs, tal como ilustra a figura a seguir:

É impreciso entender que ter um IP na faixa 2000::/3, significa que o seu IP é acessível na Internet, o que pode ser bom (ex. fácil acesso - acesso direto), mas também pode ser ruim (segurança - no IPv4 a maioria dos IPs ficavam escondidos atrás do NAT).

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1.2 Endereços Unique Local Address (ULA)**

São endereços para identificar dispositivos em redes locais, ou seja, privadas (não Internet). Tais endereços são:

  • Prefixo: fc00::/7 (Na prática, usa-se fd00::/8).
  • Uso: Endereços privados não roteáveis na Internet.
  • Equivalente IPv4: 10.0.0.0/8, 172.16.0.0/12, 192.168.0.0/16.

Note que na prática o endereço recomendado para um administrador de rede utilizar na rede local é a faixa fd00::/8 e não fc00::/8, pois ficou determinado o seguinte para o 8º bit (1111 1100):

  • Se L=0, o que vai entrar na faixa fc00::/8, este seria usado para endereços "Globalmente Atribuídos". Assim, para essa faixa uma autoridade central poderia distribuir prefixos ULA para garantir que essas rede fossem 100% únicas (semelhantes aos IPs públicos), isso ajudaria na fusão de redes locais (ex. VPNs). Todavia isso não aconteceu até agora, mas a faixa é reservada e não deve ser utilizada;
  • Se L=1, o que vai entrar na faixa fd00::/8, este seria usado para endereços "Localmente Atribuídos", ou seja, é essa faixa que os administradores de rede devem utilizar para endereçar duas redes privadas.
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1.2 Endereços Unique Local Address (ULA)

O cenário de rede a seguir apresenta duas redes privadas, sendo essas a LAN1 e a LAN2, respectivamente com as redes: fd00:1::/64 e fd00:2::/64.

É importante notar que esses IPs fd00::/8 não são roteáveis na Internet, eles só vão ser roteáveis entre as redes privadas.

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1.2 Endereços Unique Local Address (ULA)

É importante saber, que a rede anterior utilizou endereços bem simples e limpos para identificar a LAN1 e LAN2, que foram: fd00:1::/64 e fd00:2::/64. Todavia, a recomendação não é essa, a parte que identifica essas redes poderiam ser únicas globalmente, para que em uma possível fusão/comunicação com outras redes, não houvesse conflito.

Como isso deve ser feito é estipulado pela RFC 4193, mas pode ser feito em ferramentas e script em sistemas como Linux, mas principalmente pode ser utilizado geradores online, tais como:

Assim, utilizando por exemplo o https://unique-local-ipv6.com, foi gerado o fd0d:ba88:e700::/48, que pode ser utilizado nas redes do exemplo da seguinte forma:

  • LAN1 - fd0d:ba88:e700:1::/64;
  • LAN1 - fd0d:ba88:e700:2::/64.

Ou seja, as redes agora teriam esse inicio gerado automaticamente, e depois poderíamos dar a ideia de sub-rede utilizando outro "hexteto", no exemplo anterior: ...:1::/64 e ...:2::/64.

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Os endereços Link-Local (Link-Local Address) são endereços IPv6 usados exclusivamente para comunicação dentro de um único segmento de rede ou enlace local. Eles são gerados automaticamente em todas as interfaces habilitadas para IPv6 e não são roteáveis, o que significa que nunca atravessam um roteador.

  • Prefixo: fe80::/10
  • Uso: Comunicação apenas dentro do mesmo link/segmento.
  • Equivalente IPv4: APIPA 169.254.0.0/16.
  • Importante:
    • Toda interface IPv6 habilitada automaticamente gera um Link-Local.
    • Não atravessa roteadores.
    • Usado para autoconfiguração, descoberta de vizinhos (NDP).

Os endereços de Link-Local (fe80::/10) são fundamentais para o funcionamento de protocolos locais, como a Descobertas de Vizinhança, auto configuração (SLAAC) e a comunicação entre dispositivos no mesmo link antes mesmo de terem endereços globais.

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A rede a seguir apresenta a ideia do endereço Link-Local:

Atenção: neste exemplo utilizamos a parte que identifica o host como um hexteto fácil de identificar/ler. Todavia na prática a parte que identifica o host será gerado utilizando o endereço físico da placa de rede, somado a algum fator aleatório. Exemplo: fe80::d019:763a:f74c:d24

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Outra questão importante no exemplo da rede de exemplo, é que mesmo que exista o endereço fe80::1 na LAN1, com o Host A e fe80::1 na LAN2, com o Host C. Esses não entraram em conflito, pois os pacotes com endereço fe80::/10 não são roteados de uma rede para outra.

Inclusive o próprio roteador pode ter o mesmo IP para redes distintas que ele esteja conectado. É claro que isso traz confusão e estranheza para nós, mas o sistema de rede sabe separar isso.

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1.4 Endereço de Loopback

O IPv6 tal como o IPv4 também tem um endereço de loopback, também conhecido como localhost. Assim o endereço ::1 é utilizado para comunicação inter-processos e pode ser também por exemplo, utilizado para testes locais - neste contexto local significa sem sair do próprio host, já que este tipo de endereço não é roteável para fora do host.

  • IPv6: ::1/128
  • Equivalente IPv4: 127.0.0.1

É importante observar que no IPv6 o único IP localhost é o ::1 e não uma faixa de IPs, tal como era no IPv4.

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1.5 Endereço Não Especificado (Unspecified)

O endereço ::/128 (composto por 128 bits zerados) é chamado de Endereço Não Especificado (Unspecified Address). Então tal IP:

  • IPv6: ::/128
  • Equivalente IPv4: 0.0.0.0
  • Usado por hosts que ainda não têm IP.

Como endereço IP de origem, o ::/128 é usado apenas para indicar a ausência de endereço, como um host enviando um pedido DHCPv6.

1.6 Endereço da rota padrão

O ::/128 não é a rota padrão, pois a rota padrão é o endereço ::/0 - bem na verdade a parte do IP é a mesma, todavia é preciso notar que o endereço não especificado utiliza o prefixo \128, enquanto a rota padrão utiliza o prefixo \0.

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1.7 Endereço IPv4 Mapeado

O Endereço IPv6 Mapeado para IPv4 (IPv4-Mapped IPv6 Address) é um tipo especial de endereço IPv6 usado como uma técnica de transição, projetado para que aplicações possam suportar IPv4 e IPv6 simultaneamente com mais facilidade.

Esse tem o formato ::ffff:/96, onde os últimos 32 bits do endereço IPv6 são preenchidos com o endereço IPv4 (por exemplo: ::ffff:10.1.1.1).

  • Formato: ::ffff:192.168.1.1
  • Usado em técnicas de transição de IPv4 para IPv6.

O uso mais comum é em sistemas que operam em Pilha Dupla (Dual Stack), especialmente em servidores. Dessa forma, o software de um servidor (a aplicação) pode ser programado para lidar apenas com endereços IPv6, e o sistema operacional cuida de "traduzir" qualquer conexão IPv4 recebida para esse formato especial, permitindo compatibilidade total em um ambiente de Pilha Dupla.

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2. Endereços Multicast

É um endereço IP que representa um grupo de dispositivos (chamados de "membros"). Quando um pacote é enviado para um endereço multicast, a rede o entrega de forma eficiente a todos os membros que se registraram para receber essa comunicação, em vez de enviar cópias individuais para cada um. É uma comunicação do tipo "um-para-muitos". Os endereços Multicast no IPv6 são:

  • Prefixo: ff00::/8;
  • Uso: Substitui o broadcast para comunicação um-para-muitos.;
  • Escopo: Pode ser local, global, etc.

Exemplos mais importantes (Link-Local):

  • ff02::1
    • All-Nodes (Todos os Nós).
    • O verdadeiro substituto do Broadcast.
  • ff02::2
    • All-Routers (Todos os Roteadores).
    • Usado por hosts para encontrar roteadores (NDP).
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Esse tipo de endereço multicast, representado pelo ff02::, é um multicast que não é encaminhado para a Internet, ou seja, é utilizado apenas dentro de redes locais, para por exemplo descobrir roteadores na rede.

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Neste exemplo, os hosts da LAN 1, podem enviar uma mensagem para o ff02::2, que representa um multicast para roteadores locais, assim essa mensagem seria entregue tanto para o Router 1 quanto para o Router 2.

Ainda levando em conta o exemplo anterior, no IPv6 os dois roteadores vão responder como roteador a um pedido por exemplo do Host A. Então o Host A vai instalar rotas padrão (Default Router List) para o Router 1 quanto para o Router 2. Desta forma, o Host A pode inicialmente escolher enviar pacotes utilizando o Router 1, mas se esse falhar ele pode enviar para o Router 2.

É importante observar então, que o IPv6 implementa por padrão redundância e tolerância a falhas (failover) para o roteador padrão, o que não existia por padrão no IPv4.

O administrador da rede então pode determinar qual roteador da rede tem preferência (Default Router Preference), configurando esses com prioridades: alta, média e baixa. Então um roteador marcado com preferência alta, será escolhido como padrão em comparação a outros com preferência média e baixa.

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2.2 Endereços Multicast Global

O multicast com endereços IPv6 globais existem, mas na prática não são tão utilizados. Um exemplo de uso: Um serviço de sincronização de data/hora (NTP - Network Time Protocol), pode atualizar os seus clientes utilizando o endereço ff0e::101. Desta forma, todos os clientes deste serviço que utilizam tal IPv6 receberiam atualização do horário vindas do "servidor".

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2.3 Diferenciando melhor Multicast Global e Local

Vimos anteriormente um endereço multicast de Link-Local (ff02::2) e outro Global (ff0e::101). Assim, vamos entender e analisar melhor esses endereços:

  • Prefixo (ff): é o prefixo universal que identifica qualquer IPv6 multicast.
  • Flags (0): Campo "flags", no qual 0 geralmente indica u endereço permanente bem conhecido (well-known), alocado pelo IANA.
  • Escopo (2 ou e):
    • 2, se for IPv6 multicast Link-Local;
    • e, se for IPv6 multicast global.
  • Group ID (::*): O restante do endereço, é utilizado para identificar um grupo específico (Group ID), no exemplo que usamos:
    • ::2: para identificar roteadores em um Link-Local;
    • ::101: para identificar um serviço de sincronização de data/hora.
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3. Endereços Anycast

Anycast é um endereço IP único atribuído a múltiplos dispositivos. A rede entrega qualquer pacote enviado a esse endereço ao dispositivo "mais próximo" (com a menor métrica de roteamento), permitindo redundância e balanceamento de carga.

  • Formato: Usa o mesmo espaço de endereçamento Unicast.
  • Conceito: Um mesmo endereço IP (ex: 2001:db8::1) é configurado em vários dispositivos (roteadores) em locais diferentes.
  • Funcionamento: O pacote é entregue ao dispositivo "mais próximo" (menor métrica de roteamento).
  • Uso: Alta disponibilidade e balanceamento de carga (Ex: Servidores DNS).

O anycast é um conceito de roteamento (e não um recurso exclusivo de um protocolo) que já era amplamente utilizado no IPv4, sendo o 8.8.8.8 o exemplo clássico.

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3. Endereços Anycast

A rede a seguir apresenta o uso de anycast para resolução de nomes (DNS), neste caso os dois servidores de nomes têm o mesmo IP 2001:4860:4860::8888. Desta forma, quando o Host 1 tentar resolver um nome através do IP 2001:4860:4860::8888 o pacote com este pedido será enviado para o Servidor DNS 1, que pela figura está mais perto deste host, já se o Host 2 fizer o mesmo, ele será levado ao Servidor DNS 2.

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O Fim do IP de Broadcast

O IPv4 usa Broadcast (ex: 192.168.1.255 para uma rede 192.168.1.0/24):

  • Problema: Isso pode ser considerado "caro" e ineficiente, pois força toda interface de rede no enlace a parar e processar o pacote na CPU, mesmo que a informação não seja relevante.

Então, o IPv6 substitui isso pelo Multicast.

  • Muito mais inteligente: o processamento só ocorre se o host faz parte do grupo multicast.
  • ff02::1 (All-Nodes): O novo "broadcast" para todos. No endereço multicast All-Nodes, quando um host é atribuído a uma rede, ele automaticamente (através do sistemas operacional e/ou software de rede IPv6) fará parte do grupo multicast.
  • ff02::2 (All-Routers): Um "broadcast" seletivo, apenas para roteadores, sem interromper os outros hosts. Neste multicast, só receberão informações destinadas ao endereço ff02::2 os roteadores, ou seja, não são todos os dispositivos que vão processar pacotes multicast para roteadores.

É importante lembrar que essas mensagens multicast não são enviados de um enlace para outro.

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O Fim do "IP de Rede"!

O IPv6 quebra a analogia do "Endereço de Rede" (primeiro IP) do IPv4 em dois conceitos:

A. O Prefixo de Rede (Usado para a Rota)

  • No IPv4, 192.168.1.0/24 é a Rota.
  • No IPv6, 2001:db8:cafe:1::/64 é a Rota.
  • Este valor (com o ::/64) é o registro na tabela de roteamento.

B. O Primeiro IP (O Endereço Anycast da Sub-rede)

  • No IPv4, 192.168.1.0 é inutilizável.
  • No IPv6, 2001:db8:cafe:1:: (sem o /64) é um IP válido, mas reservado para Subnet-Router Anycast.
  • É um endereço anycast compartilhado por todos os roteadores no enlace.

Para quem vem do IPv4: No IPv6 o "IP da Rede" ainda identifica a rota (ex. 2001:db8:cafe:1::/64). A grande mudança é que, ao contrário do IPv4, onde o IP da Rede era inútil (ex. 192.168.1.0 em uma rede /24), no IPv6 agora ele tem uma função real: é o endereço Anycast dos roteadores.

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Resumo da Comparação (Rede e Broadcast)

Conceito IPv4 O que era Análogo no IPv6 Como Funciona
Endereço de Rede 192.168.1.0 Prefixo de Rede Identifica a rota. Ex: 2001:db8:cafe:1::/64
(Primeiro IP) (Reservado) Subnet-Router Anycast Primeiro IP (...::). Usado para falar com o roteador mais próximo.
Endereço de Broadcast 192.168.1.255 Multicast All-Nodes ff02::1. Entrega para todos os nós no enlace.
(Novo Conceito) (Não existia) Multicast All-Routers ff02::2. Entrega apenas para os roteadores no enlace.

Então no IPv6 temos que ter em mente que:

  • O primeiro IP, que identifica a rota, agora também tem a função de Subnet-Router Anycast.
  • O IP de Broadcast não existe mais, o que "economiza" o último IP de cada rede. Ele foi substituído por Multicast Link-Local (ff02::1 e ff02::2), que nunca são roteados para fora da rede.
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Cálculo da Quantidade de Hosts em redes IPv6

Calcular o número de endereços disponíveis é mais direto no IPv6.

Em IPv4:

  • Fórmula: (onde = bits de host).
  • Subtraímos 2 endereços:
    1. Endereço de Rede (primeiro IP).
    2. Endereço de Broadcast (último IP).

Em IPv6 (para uma sub-rede /64):

  • Bits de host (): bits.
  • Total de endereços IPs: (~18 quintilhões).
  • Fórmula de Hosts:
  • Subtraímos apenas 1 endereço:
    1. O "Subnet-Router Anycast" (...::).
  • Não subtraímos o broadcast. O último IP (...:ffff:ffff:ffff:ffff) é um host válido!
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Tabela Comparativa de Tipos de Endereços IPv4/IPv6

Função IPv4 IPv6 Observações
Loopback 127.0.0.1/8 ::1/128 Teste local da pilha TCP/IP
Não especificado 0.0.0.0 :: Ausência de endereço
Link-local 169.254.0.0/16 (APIPA) fe80::/10 Comunicação local (obrigatório no IPv6)
Endereços privados 10.0.0.0/8, 172..., 192... fd00::/8 (ULA) Não roteáveis na Internet
Endereços públicos Endereços roteáveis 2000::/3 (GUA) Roteáveis globalmente
Broadcast 255.255.255.255 Não existe Substituído por multicast
Rota padrão 0.0.0.0/0 ::/0 Default gateway
Documentação 192.0.2.0/24 2001:db8::/32 Exemplos e testes
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Métodos de Configuração IPv6

O IPv6 oferece múltiplas formas de configuração de endereços:

1. Configuração Estática/Manual

  • Administrador configura IP, prefixo e gateway.
  • Ideal para servidores, roteadores e infraestrutura.

2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

  • Autoconfiguração sem estado (sem servidor).
  • Host gera seu próprio IP usando informações do Roteador.

3. DHCPv6 Stateful

  • Similar ao DHCP do IPv4.
  • Servidor fornece o IP completo e todas as opções (DNS, etc.).

4. DHCPv6 Stateless

  • Híbrido: SLAAC fornece o IP + DHCPv6 fornece o resto (DNS, etc.).
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Mensagens de Autoconfiguração de Rede: RS e RA

Antes de continuar e entender os métodos de configuração IPv6 é bom saber que em grande parte ele depende do Neighbor Discovery Protocol (NDP), que é um tipo de mensagem do ICMPv6.

Assim, para conseguir a configuração de rede de forma automática, o ICMPv6 envia em sua área de dados dois tipos de mensagens sendo sessas:

  • Router Solicitation (RS), ou Solicitação de Roteador, é uma mensagem ICMPv6 (Tipo 133) que os hosts enviam para descobrir roteadores na rede local. Ela é enviada para o endereço multicast ff02::2 (All-Routers) quando o host é ativado ou precisa de configuração.
  • Router Advertisement (RA), ou Anúncio de Roteador, é uma mensagem ICMPv6 (Tipo 134) que um roteador envia para anunciar sua presença e fornecer os parâmetros de configuração da rede. Ela é enviada periodicamente para o multicast ff02::1 (All-Nodes) ou como uma resposta direta a um RS. O RA contém informações cruciais como os prefixos de rede (ex: .../64), o MTU e as flags M e O (que definem o método de configuração).

Não é intenção desse material abordar em detalhes o ICMPv6.

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Mensagens de Autoconfiguração de Rede: RS e RA

As mensagens ICMPv6 RS e RA são então encapsuladas dentro dos datagramas IPv6 e posteriormente são enviadas à Camada de Enlace

A figura a seguir apresenta a ideia do envio das mensagens de autoconfiguração de rede com o envio inicia de RS, por parte do Host A e na sequência o Router 1 respondendo com uma mensagem ICMPv6 do tipo RA.

Dentro da mensagem RA segue as flags M (Managed) e O (Other), que indicam qual tipo de autoconfiguração de rede será utilizada para o Host solicitante.

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Um pouco mais sobre as Flags M e O do ICMPv6 RA

Então as flags M (Managed) e O (Other) são bits de informação (0 ou 1) que o roteador envia dentro das mensagens de Router Advertisement (RA) para dizer aos hosts na rede como eles devem obter seus endereços IP e outras configurações.

Sendo as possíveis combinações dessas:

  • M=0 e O=0 - Neste caso seria o SLAAC Puro:
    • M=0, significa não gerenciado;
    • O=0, significa nenhuma outra informação de rede será repassada.
  • M=1 - Neste cenário a configuração será via DHCPv6 Stateful e a flag O não importa, ou seja, os hosts da rede não vão usar SLAAC, mas sim um servidor DHCP que dará todas as configurações de rede;
  • M=0 e O=1 - Neste cenário a configuração será via SLAAC, mas usando um modo híbrido, ou seja, ele vai utilizar o prefixo de rede para auto-atribuir seu IP, mas pegará outras informações, tais como IP do servidor DNS utilizando, por exemplo via um servidor DHCPv6 Stateless.

Agora vamos continuar e ver em detalhes os métodos de configuração de rede do IPv6.

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2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

É o método de autoconfiguração padrão do IPv6.

Funcionamento:

  1. Host liga e envia um Router Solicitation (RS) para ff02::2 (All-Routers).
  2. Roteador responde com um Router Advertisement (RA) contendo:
    • Prefixo da rede (ex: 2001:db8:1::/64).
    • Flags de configuração (M - Managed, O - Other), que o roteador envia dentro das mensagens RA, em resposta aos RS para informar aos hosts da rede como eles devem obter as configurações de rede.
  3. Host combina o Prefixo (64 bits) com um Interface ID (64 bits) para formar seu endereço.

Endereço = [ Prefixo do Roteador ] + [ ID da Interface ]

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2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

Vamos entender como é feita a confiugração do SLAAC:

Primeiro o computador inicia sem configuração de rede e então inicia o processo de obtenção ou auto configuração de rede.

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2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

O segundo passo é se auto atribuir um IP Link-Local na rede fe80::/64 e alocar a parte do host com seu endereço.MAC (ID da interface de rede).

Com esse IP de Link-local agora o host pode acessar a rede local.

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2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

Com um IP Link-Local único na rede, ele inicia o processo de descobri se há roteadores na rede, para isso ele envia uma mensagem RS (Router Solicitation), para o endereço multicast dos roteadore, ou seja, para ff02::2.

Se houver roteador esse vai responder com um RA (Router Advertisement).

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2. SLAAC (Stateless Address Autoconfiguration)

No cenário de exemplo, há um roteador e esse responde com o prefixo de rede 2001:db8:1::/64 e também informando o seu endereço Link-Local unicast, que no caso do exemplo é o fe80::1/64.

Então o host pega o prefixo de rede enviado pelo roteador, adiciona a parte do host o seu endereço MAC e instala a rota padrão como sendo para o gateway fe80::1.

Assim, essas imagens ilustram brevemente os passos de auto-configuração usando o método SLAAC do IPv6. É importante notar que há outras variações para esses passos, mas a ideia básica é essa.

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Como o SLAAC gera o Interface ID (Host ID)?

O host precisa gerar seus próprios 64 bits. Existem 3 formas para isso, sendo essas:

1. EUI-64 (Extended Unique Identifier)

  • Usa o Endereço MAC (48 bits) para gerar o ID (64 bits).
  • Também é inserido o FFFE ao MAC e inverte o 7º bit.
  • Desvantagem: Expõe o MAC do fabricante o que gera preocupações de privacidade.

Por exemplo:

  • Supondo que o endereço MAC de um dado host é 00:0C:29:7A:8C:5D;
  • Então o EUI-64 para esse host seria gerado como: 020c:29ff:fe7a:8c5d;

Assim, lenvando em consideração o exemplo anterior, olha-se para o primeiro grupo, que é 00 em hexa e 00000000 em binário, como o penúltimo valor (7º bit) é zero, invertendo ele vai ficar com o valor 1, ou seja: 00000010 em binário ou 02 em hexadecimal, o que resulta no valor 020c:29ff:fe7a:8c5d.

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Como o SLAAC gera o Interface ID (Host ID)?

2. Privacy Extensions (RFC 4941)

  • Gera um Interface ID aleatório e temporário.
  • Muda periodicamente (ex: a cada 7 dias).
  • Vantagem: Protege a privacidade (dificulta rastreamento).
  • Desvantagem: Dificulta o gerenciamento (logs, regras de firewall, troubleshooting), pois o IP do host está sempre mudando.
  • Padrão em sistemas: Windows, macOS, iOS e Android.

3. Aleatório Estável (Linux)

  • Gera um ID aleatório, o IP é aleatório (esconde o MAC), mas não muda.
  • Vantagem: É mais fácil de gerenciar (o IP do host é estável para logs e ACLs), sendo um "compromisso" entre EUI-64 e privacidade total.
  • Desvantagem: Menos privacidade que as Privacy Extensions, pois o dispositivo ainda é rastreável dentro daquela rede, pois a identificação não muda (o IP sempre será o mesmo).
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3. DHCPv6 Stateful (Com Estado)

Funciona de forma similar ao DHCP do IPv4: controle centralizado.

Funcionamento:

  1. Roteador anuncia no RA a flag M=1 ("Managed").
  2. Flag M=1 instrui o host: "Não use SLAAC. Peça seu IP a um servidor DHCPv6."
  3. Host envia DHCPv6 Solicit para ff02::1:2 (All-DHCP-Agents).
  4. Servidor responde com IP, gateway, DNS, etc.

Vantagens: Controle total, auditoria, gerenciamento centralizado.
Desvantagens: Requer infraestrutura de servidor; Android (antigo) não suportava.

Então, essa forma de configuração, seria muito similar ao que já é utilizado no DHCP do IPv4 (o que se utiliza atualmente). Entretanto, mesmo que o Host que vai pedir sua configuração de rede tenha em sua configuração "estática" (no momento do boot), que ele deve utilizar DHCP, ele ainda vai enviar o RS e se o RA informar que a configuração deve ser outra (SLAAC, por exemplo) o host deve acatar a configuração enviada pelo roteador via RA.

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3. DHCPv6 Stateful (Com Estado)

A figura a seguir apresenta um exemplo de uso do DHCPv6 Stateful. Neste cenário o Router 1 é o roteador da rede e também o servidor DHCPv6.

Assim, tudo inicia com o host enviando um RS, então o roteador deve lhe infomar que ele vai utilizar DHCP Stateful, isso é feito pelo RA com a flag M=1.

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3. DHCPv6 Stateful (Com Estado)

Depois do RA confirma que o tipo de configuração de rede deve ser o DHCPv6 Stateful. O host envia uma mensagem DHCPv6 solicitando sua configuração de rede, e se tudo correr bem, o servidor DHCP vai responder.

É necessário saber, que mesmo que o IPv6 consiga fazer o endereçamento ser um servidor DHCPv6 Stateful, o uso de um servidor para controlar IPs é uma prática muito recomendável, principalmente em redes maiores e mais complexas, para por, exemplo fornecer IPs conhecidos para servidores, roteadores, etc. Ou seja, sem o DHCPv6 Stateful a rede tende a ficar menos organizada.

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4. DHCPv6 Stateless (Sem Estado)

Uma combinação inteligente: SLAAC para o IP, DHCPv6 para o resto.

Funcionamento:

  1. Roteador anuncia no RA as flags M=0 e O=1 ("Other").
  2. M=0 diz: "Use SLAAC para gerar seu próprio IP."
  3. O=1 diz: "Mas, depois disso, procure um servidor DHCPv6 para pegar o resto das informações (DNS, domínio, etc.)."

Vantagens:

  • Simplicidade do SLAAC para endereçamento.
  • Flexibilidade do DHCPv6 para opções (como DNS).
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4. DHCPv6 Stateless (Sem Estado)

Esse método inicia tal como foi explicado no DHCPv5 Stateful, ou seja, com o envio do RS e a espera pela resposta de um RA, só que agora para esse método o RA deve enviar as flags M=0 e O=1.

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4. DHCPv6 Stateless (Sem Estado)

Então o host obtem do roteador que o IP pode ser stateless, mas é preciso obter outras configurações de rede via DHCP, tal como obter o IP do servidor DNS para conseguir acessar a rede por nomes. Veja o exemplo da figura a seguir:

Na figura anterior, o IP dado é obtido de forma stateless e portanto é adicionado o endereço MAC ao final do prefixo da rede obtido via RA. Todavia é enviado uma mensagem DHCPv6 para obter o IP do servidor DNS. Essas que essa resposta é dada pelo servidor DHCP, tal informação é instalada no host.

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Comparação dos Métodos de Configuração

Método Controle Complexidade Privacidade Escalabilidade Uso Típico
Estático Total Baixa Alta Baixa Servidores, Roteadores
SLAAC + EUI-64 Baixo Baixa Baixa Alta Laboratórios, Servidores
SLAAC + Privacy Baixo Baixa Alta Alta Clientes (Windows, Mac, Mobile)
DHCPv6 Stateful Total Alta Média Alta Corporativo (Controle Total)
DHCPv6 Stateless Médio Média Média Alta Híbrido (Melhor dos dois)
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Considerações Finais

  • Desafios: Custo de atualização, complexidade do Dual-Stack, inércia ("se o IPv4 funciona, por que mudar?").
  • Por que migrar? O esgotamento do IPv4 é real. CGNAT é problemático. IoT e 5G exigem IPv6.
  • Estratégia:
    1. Planejamento (inventário, treinamento).
    2. Piloto (rede de teste).
    3. Implementação Dual-Stack.
    4. Migração para IPv6-Only (futuro).

O IPv6 não é uma questão de "se", mas de "quando".

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Referências e Leitura Adicional

  • RFC 8200: Internet Protocol, Version 6 (IPv6) Specification
  • RFC 4291: IP Version 6 Addressing Architecture
  • RFC 4861: Neighbor Discovery for IP version 6 (NDP)
  • RFC 4862: IPv6 Stateless Address Autoconfig (SLAAC)
  • RFC 4193: Unique Local IPv6 Unicast Addresses (ULA)
  • Google IPv6 Statistics: https://www.google.com/intl/en/ipv6/statistics.html
  • IPv6.br: https://ipv6.br/
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IPv6

Introdução

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luiz.arthur.feitosa.santos@gmail.com/luizsantos@utfpr.edu.br

Fim... Obrigado!

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## Estrutura do Cabeçalho IPv6 Uma das maiores melhorias: eficiência no roteamento. * **IPv4:** Cabeçalho **variável** de 20 a 60 bytes (com opções). * Roteadores precisam ler o campo "Header Length" e processar opções. * **IPv6:** Cabeçalho **fixo** de 40 bytes. * Roteadores não perdem tempo: o tamanho é sempre 40. * Processamento muito mais rápido (otimizado para hardware). **O que foi removido do cabeçalho IPv4?** * `Header Length` (tamanho fixo) * `Header Checksum` (removido; TCP/UDP já fazem verificação) * `Identification`, `Flags`, `Fragment Offset` (movidos para... ⬇️) --- ## Cabeçalhos de Extensão Para manter a flexibilidade, o IPv6 moveu as "Opções" do IPv4 para **Cabeçalhos de Extensão** opcionais. * O roteador só lê o cabeçalho principal de 40 bytes. * O campo `Next Header` aponta para o próximo cabeçalho (TCP, UDP, ou um cabeçalho de extensão). * Roteadores de "meio de caminho" (core) **não** processam as extensões, apenas o destino final. **Tipos de Extensão:** * `Routing` (Especifica rota) * `Fragment` (Fragmentação) * `Authentication Header (AH)` (IPsec) * `Encapsulating Security Payload (ESP)` (IPsec) --- ## Neighbor Discovery Protocol (NDP) O **NDP** é o "canivete suíço" do IPv6. É um protocolo baseado em **ICMPv6** que substitui um conjunto de ferramentas do IPv4: | Função no IPv6 (NDP) | Protocolo que Substitui no IPv4 | | :--- | :--- | | **Resolução de Endereços** (MAC) | **ARP** | | **Descoberta de Roteadores** (RS/RA) | **ICMP Router Discovery** | | **Redirecionamento de Rota** | **ICMP Redirect** | | **Autoconfiguração** | (DHCP) | | **Detecção de End. Duplicado (DAD)** | (ARP "gratuito") | | **Detecção de Vizinho Inalcançável** | (N/A) | --- ## NDP: Mensagens ICMPv6 Principais O NDP usa 5 tipos de mensagens: 1. **Router Solicitation (RS)** * Host -> `ff02::2` (All-Routers) * *Tradução:* "Ei, tem algum roteador aí?" 2. **Router Advertisement (RA)** * Roteador -> `ff02::1` (All-Nodes) * *Tradução:* "Sim, eu sou o gateway. O prefixo da rede é `.../64` e as flags são M=0, O=1." 3. **Neighbor Solicitation (NS)** * Host A -> Host B (via *Solicited-Node Multicast*) * *Tradução:* "Qual é o MAC do `...::2`?" (O novo ARP Request) 4. **Neighbor Advertisement (NA)** * Host B -> Host A * *Tradução:* "Meu MAC é `aa:bb:cc:dd:ee:ff`." (O novo ARP Reply) 5. **Redirect** (Informa sobre rotas melhores) --- ## NDP: Resolução de Endereços (O Novo ARP) **Cenário:** Host A (`...::1`) quer enviar um pacote para o Host B (`...::2`). 1. **Host A** (Sabe o IP, não sabe o MAC) * Envia **Neighbor Solicitation (NS)**. * Origem: `...::1` * Destino: `ff02::1:ff00:2` (Solicited-Node Multicast) * *Isso é melhor que o ARP (broadcast), pois só o Host B processa.* 2. **Host B** (Ouve o multicast e reconhece seu IP) * Envia **Neighbor Advertisement (NA)**. * Origem: `...::2` * Destino: `...::1` (Unicast) * *Contém seu endereço MAC.* 3. **Host A** * Recebe o NA e armazena o MAC na **Neighbor Cache** (A nova "Tabela ARP"). --- ## NDP: Detecção de Endereços Duplicados (DAD) Antes de usar um endereço IPv6 (manual, SLAAC ou DHCP), o host deve executar o DAD. **Processo:** 1. Host gera o endereço que deseja usar (ex: `2001:db8::10`). 2. Host envia um **Neighbor Solicitation (NS)** para o endereço que ele mesmo quer usar. * *Tradução:* "Alguém aí já está usando o IP `2001:db8::10`?" 3. **Cenário A: Silêncio (Sem Resposta)** * Ninguém respondeu com um NA. * **Resultado:** O endereço é único e pode ser usado. 4. **Cenário B: Resposta (NA)** * Outro host responde: "Ei, esse IP é meu!" * **Resultado:** Conflito. O endereço está duplicado e não pode ser usado. --- ## Segurança no IPv6 O IPv6 foi projetado com segurança em mente. **1. IPsec Obrigatório** * No IPv4, IPsec é opcional. No IPv6, é parte **obrigatória** do protocolo. * **AH (Authentication Header):** Garante autenticidade e integridade (o pacote não foi modificado). * **ESP (Encapsulating Security Payload):** Garante confidencialidade (criptografia). **2. SEND (Secure Neighbor Discovery)** * Extensão de segurança para o NDP que previne *spoofing* de RAs e NAs (ataques Man-in-the-Middle). * Usa **CGA (Cryptographically Generated Addresses)** (Endereços gerados a partir de chaves públicas). **3. Dificuldade de Scaneamento (Scanning)** * Escanear uma rede `/64` (com $2^{64}$ hosts) é matematicamente inviável, ao contrário de uma `/24` no IPv4. --- ## Segurança: Novos Desafios Apesar das melhorias, o IPv6 introduz novos desafios: 1. **Configuração Incorreta (Dual-Stack)** * Muitos administradores focam no firewall IPv4 e esquecem do IPv6, deixando a rede exposta. * "Ataque via IPv6 em uma rede IPv4". 2. **Firewalls Desatualizados** * Equipamentos antigos que não inspecionam cabeçalhos de extensão IPv6. 3. **Tunelamento (6in4, Teredo)** * Túneis podem ser usados para *burlar* firewalls IPv4, encapsulando tráfego malicioso dentro de pacotes IPv4 permitidos. 4. **Novos Ataques** * Exploração de cabeçalhos de extensão, *spoofing* de RA (se o SEND não for usado). --- ## Técnicas de Transição (IPv4 <-> IPv6) IPv4 e IPv6 não são diretamente compatíveis. Técnicas são necessárias para a coexistência. **1. Dual Stack (Pilha Dupla) - [RECOMENDADO]** * O dispositivo (host, roteador) executa **ambos** os protocolos simultaneamente. * Tem um endereço IPv4 e um endereço IPv6. * Fala IPv4 com destinos IPv4 e IPv6 com destinos IPv6. **2. Tunelamento (Tunneling)** * Encapsula pacotes IPv6 *dentro* de pacotes IPv4 (ou vice-versa) para atravessar redes incompatíveis. * Ex: 6in4, 6to4, Teredo. **3. Tradução (Translation)** * Converte um protocolo no outro. * Ex: **NAT64** (permite rede IPv6-only acessar servidores IPv4). --- ## Transição: 1. Dual Stack (Recomendado) * **Conceito:** A solução mais simples e robusta. * **Funcionamento:** A interface tem ambas as configurações. ``` Interface: eth0 IPv4: 192.168.1.10/24 Gateway IPv4: 192.168.1.1 IPv6: 2001:db8:1::10/64 Gateway IPv6: fe80::1 ``` * O S.O. usa "Happy Eyeballs" (RFC 8305) para testar ambas as conexões e usar a mais rápida (geralmente prefere IPv6). * **Vantagem:** Compatibilidade total. * **Desvantagem:** Gerenciamento de duas redes, dobra a superfície de ataque. --- ## Transição: 2. Tunelamento (6in4) * **Conceito:** "Pacote dentro de um pacote". * **Uso:** Conectar "ilhas" IPv6 através da vasta Internet IPv4. * **Funcionamento (6in4):** 1. Pacote IPv6 é criado. 2. É encapsulado *dentro* de um pacote IPv4 (Protocolo 41). 3. Atravessa a rede IPv4. 4. O destino desencapsula e lê o pacote IPv6. `[Cabeçalho IPv4 | Cabeçalho IPv6 | Dados]` * **Tipos:** Manual (roteador a roteador), Tunnel Broker (ex: Hurricane Electric), 6to4 (automático, obsoleto), Teredo (atravessa NAT). --- ## Transição: 3. Tradução (NAT64 + DNS64) * **Uso:** Permitir que clientes **IPv6-Only** acessem servidores **IPv4-Only**. * **Funcionamento:** 1. Cliente (só IPv6) consulta `site-ipv4.com` no DNS. 2. O **DNS64** vê que o site só tem registro `A` (IPv4). 3. O DNS64 "sintetiza" um registro `AAAA` (IPv6) usando um prefixo especial (ex: `64:ff9b::[IP_do_site_v4]`). 4. Cliente (IPv6) envia o pacote para `64:ff9b::...` 5. O gateway **NAT64** recebe, traduz o pacote para IPv4 e o encaminha. * **Desvantagem:** Quebra a conectividade ponta-a-ponta; é complexo. --- ## Adoção do IPv6 no Mundo e no Brasil **Estatísticas Globais (Google, 2024):** * **Adoção global:** ~40-45% dos usuários. * **Países líderes:** * França: ~75% * Índia: ~70% * Alemanha: ~65% * EUA: ~48% **Adoção no Brasil (2024):** * **Marco: Brasil ultrapassou 50% de adoção em Fev/2024!** * **Operadoras (Vivo, TIM, Claro):** Lideram com > 70% de tráfego IPv6. * **Desafio:** Adoção baixa em sites de conteúdo e governo (~30%). --- ## Fatores que Impulsionam a Adoção 1. **Esgotamento de IPv4:** A causa raiz. 2. **CGNAT:** Provedores colocam clientes atrás de NAT (NAT do provedor), o que quebra jogos, P2P, etc. O IPv6 resolve isso. 3. **IoT (Internet das Coisas):** Impossível conectar bilhões de dispositivos sem IPv6. 4. **5G:** Redes 5G são projetadas para serem IPv6-nativas. 5. **Cloud Computing:** Provedores de nuvem (AWS, Google, Azure) suportam IPv6. --- ## Resumo das Vantagens do IPv6 * **Espaço de Endereçamento:** $2^{128}$ (Fim do esgotamento). * **Fim do NAT:** Restaura a conectividade ponta-a-ponta. * **Autoconfiguração (SLAAC):** Simplifica o gerenciamento da rede. * **Cabeçalho Fixo:** Roteamento mais rápido e eficiente. * **Segurança:** IPsec nativo e obrigatório. * **Eficiência:** Fim do Broadcast (usa Multicast). * **Mobilidade:** Suporte nativo (MIPv6). * **Futuro:** Essencial para IoT, 5G, Cidades Inteligentes. ---